quarta-feira, 20 de março de 2019

"A PARTICIPAÇÃO INDIGNA DA CEIA DO SENHOR UM ESTUDO DE CASO EM 1 CORINTIOS 11:17-34"


Objetivo deste estudo é ajudar o leitor a entender o significado original da expressão: Indignamente
Tema do referente estudo: "A PARTICIPAÇÃO INDIGNA DA CEIA DO SENHOR UM ESTUDO DE CASO EM 1 CORINTIOS 11:17-34"
ETIMOLOGIA -
A palavra grega traduzida por indignamente (a/naciwj) é uma hapax legomena.
Em outras palavras, em todo o Novo Testamento ela somente ocorre nesta passagem.
Se Paulo quisesse exigir um caráter digno dos participantes da Ceia em Corinto, teria empregado a palavra a/nacioj e não a/naciwj.
A diferença entre as duas é realmente pequena, apenas um trocadilho entre as letras oj e o wj.
Todavia, a palavra a/nacioj é um adjetivo, o que qualificaria o caráter do participante.
Enquanto que a/naciwj é um advérbio que descreve o modo da ação do participante.
Por ser uma hapax legomena dificulta uma análise comparativa da palavra pelo número de ocorrências.
Entretanto, é possível fazê-lo de seu antônimo.
Pode-se concluir que, enquanto a palavra a/ciwj é "agir de modo digno", a palavra a/naciwj significa "agir de modo indigno".
Paulo adverte contra a celebração da Ceia do Senhor de modo indigno (anaxios).
Não é tanto uma exigência de qualidades morais nos participantes, mas, sim, procurar um modo de vida de acordo com o evangelho, i.é, o amor mútuo (cf. o contexto, 1 Co 11:17-34)."
O advérbio "indignamente" possui na língua portuguesa um sentido moral que não corresponde com exatidão ao significado da palavra grega a/naciwj.
O Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa fornece as seguintes explicações dos verbetes correlatos: desprezível, torpe, inconveniente, impróprio.
Neste caso, somente a palavra "impróprio" aproxima-se do significado original.
Por isso, traduzir a/naciwj por indignamente, como ocorre na Versão Revista e Atualizada, embora esteja correto, não esclarece o seu sentido completamente.
Na língua portuguesa a palavra indigno tem a sua origem no latim, significa "algo que não convém, indigno, que não merece, não merecedor, injusto, vergonhoso, infamante."
Daí o entendimento popular, de que para participar da Ceia do Senhor a pessoa necessita ser "digna", subentendendo as suas virtudes pessoais, ou boa conduta como mérito.
A palavra a/naciwj não sugere mérito pessoal próprio do participante.
Esta palavra simplesmente acusa a maneira como se procedeu na ou durante a ceia.
Spiros Zodhiates comenta que este verbete grego significa "indignamente, irreverente, de uma maneira indigna (1 Co 11:27, 29), tratando a Ceia do Senhor como se fosse um alimento comum, sem atribuir-lhe, e aos seus elementos o valor próprio."
RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA CEIA EM CORINTO -
Paulo escreve esta epístola corrigindo várias distorções cometidas pelos coríntios.
O apóstolo reprova: 
As divisões (1:10-4:20).

O vergonhoso e público caso de incesto de um de seus membros (5:1-13).
Disputas legais entre cristãos (6:1-11).
Casos de envolvimento com prostitutas (6:12-20). 
Desentendimentos quanto ao valor do casamento (7:1-40).

Participação de festividades pagãs e comidas oferecidas a ídolos (8:1-11:1).
Os três problemas seguintes estão relacionados com as reuniões públicas dos cristãos em Corinto.
A explicação da autoridade entre homens e mulheres na igreja (11:2-16).
O segundo relata as distorções da Ceia do Senhor (11:17-34).
A terceira problemática sobre o culto na igreja de Corinto envolve a má compreensão da distribuição e usos dos dons (12:1-14:40).
Em seguida, Paulo fornece um esclarecimento da veracidade da ressurreição de Cristo, e a certeza da ressurreição futura dos crentes (15:1-58).
Solicita como a igreja deve proceder para a coleta (16:1-11)
E a ida de Apolo (16:12).
Retornando a questão da Ceia...
O problema da Ceia não era generalizado, mas era perceptível.
Não é possível sustentar que toda a igreja de Corinto se encontrava reprovada por Paulo.
Ele mesmo diz que "porque importa que haja partidos entre vós, para que também os aprovados se tornem conhecidos em vosso meio" (vs. 19).
Os abusos da Ceia em Corinto envolviam apenas os cristãos.
Não há indícios de que nesta perícope Paulo esteja preocupado em restringir a Ceia.
Os coríntios não estavam sendo acusados de permitir a participação de incrédulos na Mesa do Senhor.
Não eram os incrédulos que estavam profanando a Ceia, mas as atitudes ímpias dos cristãos coríntios.
Há dois modos de reconstruir a reunião da Ceia da igreja Corinto:
O primeiro modelo sugere que a Ceia seguia o padrão de um jantar comum.
Isto pressupõe uma refeição extraída da cultura greco-romana.
Segundo este modelo a Ceia da igreja de Corinto possuía duas fases.
A primeira desenrolava-se numa refeição comum, com o propósito de nutrição.
Logo em seguida, viria uma segunda parte, com a celebração solene da Ceia do Senhor.
Esta interpretação explica que durante a primeira fase da refeição os crentes de Corinto cometiam sérios abusos, tais como egoísmo, bebedeira, glutonaria e desprezo pelos irmãos pobres.
O comentarista F.W. Grosheide relaciona o significado da indignidade ao errôneo uso da Ceia.
Ele argumenta que "indignamente: isto implica que uma certa dignidade, ou valor está relacionado com o pão e o cálice.
Aquele que os utiliza sem levar em conta o seu valor, os usa de um modo indigno, ou seja, não está de acordo com o seu valor.
Um tão indigno uso os coríntios fizeram da Comunhão quando serviram-na, seguida duma festa do amor unida pela discórdia."
Embora Grosheide capte o significado original da palavra indignamente, ele o erra em sua aplicação.
Defende que o erro dos coríntios era ter a Ceia do Senhor como sendo de inferior valor, por realizá-la após uma festa.
Deve-se notar que ele pressupõe um modelo de ceia greco-romana.
A igreja de Corinto teria apenas feito uma ligeira adaptação para celebrar a Ceia do Senhor após a refeição principal.
Como nas refeições greco-romanas, a principal e mais importante era a primeira refeição, servida para a nutrição, a que era servido em seguida objetivava encerrar o jantar, mas não tinha valor nutritivo.
Esta concepção torna-se insustentável pelo fato, que não é provável que a Igreja Primitiva tenha mudado a sua prática litúrgica tão cedo, abandonando o modelo da ceia pascal judaica, pela ceia greco-romana.
A história aponta para a preservação da tradição original, pelo menos nos primeiros dois séculos.
Sendo que a Ceia do Senhor que viria em seguida já não teria importância, para os que se atrasaram e não participaram da primeira refeição, estando ainda com fome e gerando um descontentamento entre os cristãos coríntios.
James D.G. Dunn está correto ao discordar desta reconstrução entende que "o problema neste caso é que Paulo parece ter em mente só uma única refeição comum (a Ceia do Senhor).
A prática que ele reprova não é a de uma refeição separada (precedente) da Ceia do Senhor, mas o abuso de uma única refeição (a Ceia do Senhor) que começava com o único pão e terminava com o cálice 'após a ceia' (11,25)."
A segunda reconstrução histórica interpreta a Ceia do Senhor como sendo uma única refeição numa reunião com o propósito solene de celebrar a comunhão da Igreja de Cristo.
Seguindo o padrão da ceia Pascal, então, a interpretação toma outro rumo.
Primeiro, pressupõe-se que a Ceia do Senhor, em alguma medida, possuí continuidade com a refeição da antiga Aliança. 
Segundo, a Ceia era uma refeição litúrgica (Mt 26:30), seguindo os moldes da tradição apostólica (eu recebi do Senhor o que também vos entreguei, vs. 23), não meramente uma reunião de confraternização.

Em terceiro lugar, Paulo usa uma palavra muito específica para a "ceia" (dei@pnon) que se refere ao "principal alimento recebido à noite" não se referindo a uma refeição secundária.
A Ceia do Senhor representa, entre outras concepções, a comunhão da Igreja de Cristo (10:17). 
O comportamento partidário e egoísta contradizia abertamente o sentido da cerimônia.

Tal era a distorção das reuniões dos coríntios, que descaracterizavam a Ceia, tornando o ambiente impróprio de celebrar a comunhão do Corpo de Cristo (vs. 20).
Não se deve admitir que as divisões dentro da igreja de Corinto ocorriam somente por problemas sociais.
James D.G. Dunn interpreta, erroneamente, que "é particularmente evidente que a tensão era basicamente entre cristãos ricos e cristãos pobres, isto é, entre os que tinham comida e bebida suficiente e suas próprias casas (11,21-22) e 'os que nada têm' (11,22)".
--> Percebe-se que o principal problema que afetava a celebração da Ceia da igreja de Corinto eram os partidarismos relacionados a uma má compreensão de quem eram os seus líderes.
Dentro da igreja havia discórdia e competição, pois "cada grupo se jactava da sabedoria superior de seu escolhido (1:10-17)."
O problema não era apenas uma luta de classes sociais.
O texto refere-se a "divisões" (vs. 18) e a "partidos" (vs. 19).
Não eram apenas dois grupos em desentendimento, mas vários, acerca de diversos assuntos (cf.  3:4, 22; 8:7, 9, 13; 9:2; 11:22).
Thomas C. Oden prefere uma interpretação moral para indignamente.
Em vez de recorrer a palavra grega original, ou, ao contexto próximo da passagem, ele busca uma relação com a desqualificação moral do caráter de alguns cristãos coríntios.
Citando alguns versículos Oden concebe a seguinte ponte "aqueles que tem um procedimento desordenado são admoestados (2 Ts 3:6-15).
Alguns 'devem examinar a si mesmos antes de comer do pão e beber do cálice.
Pois o que come e bebe sem discernir o corpo do Senhor, come e bebe juízo para si' (1 Co 11:28-29).
Paulo especificamente instrui os coríntios que ele não deveriam comer 'com alguém que chamasse a si mesmo de irmão, mas que era sexualmente imoral ou ganancioso, um idólatra ou um caluniador, beberrão ou mentiroso' (1 Co 5:11)."
Entretanto, o advérbio indignamente refere-se ao modo da ação, não especificamente ao caráter do agente.
Já Leon Morris sugere que a participação digna da Ceia deve ser com fé.
Ele declara que "mas noutro sentido podemos vir dignamente, isto é, com fé, e com a devida realização de tudo que é pertinente a tão solene rito. Negligenciar nisto é vir indignamente no sentido aqui censurado."
Todavia, os que participavam da Ceia não estavam sendo reprovados por sua falta de fé. O problema não era esse.
Nem por permitirem a participação de incrédulos. O problema também não era esse.
A sua reprovação era por desprezar o cerimonial da Ceia e a comunhão dos irmãos.
O grande teólogo da antiga Princeton Charles Hodge defende que a participação indigna significa participar com espírito negligente e irreverente.
Ele diz que "se a Ceia do Senhor é em sua própria natureza uma proclamação da morte de Cristo, conseqüentemente que os que participam dela como se fosse uma comida ordinária, ou de maneira irreverente, ou com qualquer outro propósito que o moveu a realizá-la, são culpados do corpo e do sangue do Senhor."
Em seguida define dizendo que "comer ou beber indignamente é, em geral, vir a mesa do Senhor com espírito negligente e irreverente; sem intenção nem desejo de comemorar a morte de Cristo como sacrifício por nossos pecados, e sem o propósito de cumprir as obrigações que com ela contraímos."
Hodge cai no erro de interpretar a participação indigna como sendo um problema subjetivo.
C.K. Barret interpreta que o indignamente é posicionar-se com hostilidade aos irmãos durante a Ceia.
Barret declara "o que Paulo entende por indignamente é explicado pelos versos 21 em diante; ele pensa das falhas morais de partidarismo e ganância que marcavam a reunião dos coríntios."
Continua esclarecendo que "comer e beber indignamente (no sentido indicado acima) é contradizer tanto o propósito da auto-entrega de Cristo, e o espírito no qual foi feito, e situar-se entre aqueles que foram responsáveis pela crucificação, e não entre aqueles que pela fé receberam o seu fruto."
A segunda citação possuí uma implicação lógica que é verdadeira.
Mas, ela não se encontra de modo objetivo na passagem (11:17-34).
Logo, não é possível incluí-la como um aspecto da indignidade que Paulo estava reprovando.
John F. MacArthur Jr. sustenta que a indignidade refere-se a uma depreciação da cerimônia.
Comenta que "vir indignamente à Comunhão é uma simples desonra a cerimônia; é uma desonra Àquele a quem a honra é celebrada. 
Tornamo-nos culpados de desonrar o seu corpo e sangue, que representam a Sua obra e completa graça por nós, Seu sofrimento e morte em nosso favor."

A interpretação de MacArthur é parcial.
Ao expor que os coríntios estavam desonrando a cerimônia, omite os abusos cometidos entre os cristãos coríntios (cf. vs. 17-22, 33-34).
Simon Kistemaker prefere uma interpretação inclusiva.
Reconhece que há uma variada gama de definições acerca do significado da maneira indigna que a Ceia foi realizada.
Simplesmente prefere assumir que talvez Paulo tenha pretendido que o advérbio indignamente fosse interpretado de modo mais amplo possível.
É verdade que alguns dos coríntios mostravam falta de amor, enquanto outros deixaram de distinguir entre a festa de fraternidade e a observância da Ceia.
Ambos estavam errados, e Paulo os confronta.
Mas o texto tem uma mensagem para a Igreja universal, também.
Os cristãos nunca devem considerar a celebração um mero ritual.
Ao contrário, os crentes sinceros devem aguardar com alegria a Ceia do Senhor.
Os cristãos devem confessar não serem dignos por causa do pecado, mas terem sua posição de dignidade por causa de Cristo.
Paulo não está exigindo perfeição antes que se permita aos crentes virem à mesa da comunhão.
Ele defende um estilo de vida governado pelas reivindicações do evangelho de Cristo, e que tribute o mais alto louvor a Deus.
É possível que Kistemaker tenha razão.
Mas, parece que a passagem trata de um problema bem específico.
Entretanto, pelo fato do apóstolo exigir um auto-exame, e indicar a ocorrência de disciplinas distintas, e por fim fazer uma recomendação dirigida a mutualidade (esperai uns pelos outros, vs. 33), é mais correto pensar que a participação indigna na Ceia também poderia ser um problema específico.
O SIGNIFICADO DA PARTICIPAÇÃO INDIGNA - 
A igreja de Corinto estava quebrando uma tradição cristã.

No início de 1 Co 11 Paulo louva os coríntios por estarem fielmente guardando "as tradições assim como vo-las entreguei (vs. 2)."
Porém, encontramos o contraste no verso 22 quando num triste e enfático tom Paulo declara que "certamente, não vos louvo".
Não era apenas uma questão de usos, ou costumes, mas uma cerimônia que celebrava a Aliança com o próprio Senhor Jesus, e necessitava ser preservada.
F.F. Bruce explica que a Ceia foi algo que Paulo "o recebeu 'do Senhor', no sentido de que toda tradição cristã tem sua fonte no Senhor crucificado e exaltado, assim como nele, ela é validada para sempre."
A citação de Kistemaker pode reforçar esta idéia quando diz "Paulo revela que a comunhão também é o ato repetido de se receber e entregar o sacramento até que o Senhor volte (vs. 26)."
A participação indigna consiste em desprezar a mútua comunhão que Cristo pelo seu sacrifício expiatório une a Igreja, isto é, o Seu Corpo.
Os coríntios estavam numa reunião que deveria ter o propósito de celebrar a unidade da Igreja do Senhor.
Entretanto, usavam daquele momento para desprezar uns aos outros.
Gordon Fee observa que "tal conduta é indigna da Mesa onde está sendo proclamada a morte de Jesus até que ele venha." 
F.F. Bruce sumariza todo o problema ao dizer que quando eles partiam o pão que era o símbolo do corpo de Cristo, eles relembravam seu auto-sacrifício na cruz, mas também declaravam participar todos juntos do seu corpo coletivo.

Por isso, se eles, na prática, negavam a unidade que professavam simbolicamente na Ceia, estavam comendo e bebendo de modo indigno, profanando, assim, o corpo e o sangue do Senhor; se eles comiam e bebiam "sem discernir o corpo", estavam comendo e bebendo condenação para si mesmos.
Comer e beber "sem discernir o corpo" significa simplesmente tomar o pão e o cálice, ao mesmo tempo que tratavam seus irmãos cristãos sem amor, em pensamento ou ação.
Nos escritos paulinos o conceito de "estar em Cristo" não admite uma não mútua comunhão com os que são salvos por Ele.
A ênfase na koinonia é perene nos escritos do apóstolo.
F.F. Bruce observa que "a contribuição diferente que Paulo faz à doutrina da ceia está em sua ênfase na refeição como uma ocasião de comunhão (koinonia) e em sua interpretação da palavra pão, 'este é o meu corpo', fazendo-a englobar o corpo coletivo de Cristo."
Esta comunhão é apenas um reflexo da relação que o Corpo tem com a Cabeça (1 Co 10:16-17; Cl 1:18-20; Jo 17:20-26).
A santidade da comunhão deveria ser manifesta na Ceia da Comunhão.
Herman Ridderbos comenta que a palavra 'indignamente' a duras penas reproduz o sentido da expressão; porque se deve excluir toda idéia que insinue que por mérito pessoal, ou algum reclamo legal alguém possa fazer-se 'digno'.
A imagem é melhor se expressa em comer e beber de um modo inadequado, impróprio e incoerente com o seu significado.
É uma questão de respeito pelo verdadeiro caráter do que aqui se chama o pão e o cálice do Senhor; isto é, respeito pela santidade desta comunhão (cf. 1 Co 10:21).
A participação da Ceia envolvia a responsabilidade de avaliar o que era aquele singular momento.
As pessoas envolvidas deveriam ter consciência da seriedade daquela cerimônia.
O que era representado nos elementos.
A espécie de relacionamento que ela estabelecia tanto com Cristo, o seu anfitrião, quanto com os demais membros participantes da Igreja do Senhor.
Kistemaker comenta que "os coríntios devem saber que não podem participar da Comunhão com o coração cheio de desprezo nem de frivolidade.
Depois do devido auto-exame, devem se aproximar da mesa do Senhor com amor genuíno para com seu Senhor e para com o seu próximo."
A ordenança ao exame pessoal é o remédio contra a indignidade.
Não era para julgarem uns aos outros.
Mas cada um a si mesmos sobre o modo de como estavam se portando na Ceia.
Gordon Fee sugere que provavelmente isto não seja tanto uma ameaça quanto um chamado a uma conduta verdadeiramente cristã na Ceia.
Neste sentido exorta os coríntios a examinarem-se.
Sua conduta desmente o evangelho ao qual asseguram compromisso.
Antes de participar no banquete, devem examinar-se acerca de suas atitudes para com o corpo, como estão tratando aos demais, sendo que o próprio banquete é um lugar de proclamação do evangelho.
Parte da celebração apropriada da Ceia envolvia o discernir o que significava o "corpo"(vs. 29).
Algumas sugestões tem sido dadas para interpretar o que Paulo quis realmente dizer com "discernir o corpo".
Leon Morris afirma que se refere a "distinguir a ceia do Senhor de outras refeições, isto é, não considerá-la como qualquer outra refeição."
Kistemaker segue o mesmo raciocínio dizendo que "os participantes devem fazer uma distinção clara entre o pão que eles comem na festa da fraternidade para o nutrimento do corpo físico e o pão da Ceia do Senhor em benefício do corpo de crentes."
Uma segunda opinião sugerida por alguns intérpretes seria de que os coríntios não refletiam sobre o significado expiatório da Ceia.
Isto é, que a ceia representa a satisfação vicária de Cristo oferecida ao Pai.
Todavia, uma terceira opinião parece merecer crédito: o conceito de que "corpo" refere-se à comunhão da Igreja de Cristo.
Algumas evidências favorecem esta última interpretação.
Primeiro, é ilusório pensar que os versos 27 e 29 são paralelos.
O verso 29 não contém no original a variante "indignamente".
Segundo, Paulo já havia fornecido uma definição do que ele entendia por "corpo" em 10:16-17.
Neste caso o verso 27 seria uma das comuns digressões do apóstolo.
Gordon Fee observa que "o 'significado' desse 'corpo' nesta Mesa é aqueles que comem do único pão que são eles mesmos o único corpo."
Terceiro, deve ser observado a ênfase da palavra sinerxomai (reunir, vs. 17, 18, 33, 34).
Quarto, Paulo mantém na perícope seguinte (12:1-31) o uso do termo "corpo" para referir-se a unidade da Igreja, e não para o pão da Ceia.
Então, "discernir o corpo" presume uma exigência de participar da Ceia entendendo a comunhão, uns com os outros, forjada na união com Cristo.
A declaração do apóstolo no verso 30 não se trata de uma ameaça, mas de uma constatação.
Gordon Fee comenta que "isto não é uma exortação nem uma advertência; é uma reflexão ad hoc sobre a situação deles."
Os que estão em Cristo não precisam temer o juízo condenatório (Rm 8:1).
Todavia, estes tristes efeitos dos abusos cometidos pelos cristãos coríntios testemunhavam do seu comportamento impróprio uns com os outros na Ceia do Senhor.
Na Bíblia de Estudo de Genebra encontra-se o seguinte comentário "visto que alguns dos crentes de Corinto estavam celebrando a Ceia de uma maneira que destruía a unidade que ela representa, Deus tinha imposto julgamentos contra a comunidade.
O propósito de Deus ao julgar aqueles crentes, porém, era de impedi-los de serem 'condenados com o mundo' (vs.32)."
Paulo considera necessário informar aos cristãos coríntios que o sofrimento estava relacionadas com a observância inapropriada da Ceia do Senhor.
A menção das enfermidades e morte é no seu sentido literal.
Charles Hodge afirma que "visto que não há nada no contexto que indique que estes termos devem ser usados no sentido figurado de enfermidades morais e decadência espiritual, devem ser tomadas em seu sentido literal."
G.G. Findlay sugere que "a mera coincidência de tais aflições com a profanação da Ceia poderia não justificar Paulo em fazer tal declaração; necessitaria estar consciente de alguma revelação específica para esta conseqüência."
Paulo não justifica a fonte da sua afirmação.
Não é possível saber se ele diagnostica a situação dos cristãos coríntios pela informação vinda alguém da própria igreja, ou por uma revelação especial vinda do próprio juiz, o Senhor Jesus.
CONCLUSÃO:
O participante
Deve ter uma conduta apropriada em relação à Ceia do Senhor.
Precisa discernir o ato da celebração.
Precisa reconhecer que a Ceia não é uma refeição ordinária, mas que representa a morte expiatória de Cristo.
Por isso, ela é o sinal da nova Aliança.
Precisa viver um estilo de vida com os demais membros de acordo com aquilo que a Mesa do Senhor representa.
James D.G. Dunn corretamente expressa que "a preocupação de Paulo estava concentrada no pão e no cálice como expressões primárias da unidade da congregação e como meio dessa unidade quando corretamente celebrados".
Herman Ridderbos também contribui dizendo que "quando a igreja celebra a Ceia, ela 'anuncia' verbalmente numa auto-descrição o que ela significa."
Pesa sobre o participante a responsabilidade de exercer um auto-exame da qualidade dos seus relacionamentos com os demais participantes.
A Ceia também representa a comunhão do Corpo, isto é, da Igreja de Cristo.
James D.G. Dunn conclui que "uma Ceia do Senhor que não era uma ceia compartilhada, que não era um participar de um só pão e de um só cálice, não era efetivamente a Ceia do Senhor."
Nada pode diluir a comunhão espiritual que há entre os cristãos.
Pois, nada pode separar a Igreja de sua comunhão espiritual com Cristo.
Uma vez salvos em Cristo, os cristãos tornam-se membros do mesmo Corpo.
Entretanto, a prática da mutualidade pode ser corrompida e afetada.
Se houver uma reunião onde não há a mútua comunhão, não há a Ceia do Senhor.
Esta foi a avaliação de Paulo "quando, pois, vos reunis no mesmo lugar, não é a ceia do Senhor que comeis" (11:20).
Eles tornavam a sua reunião indigna, isto é, imprópria para realmente celebrar a Ceia do Senhor, por causa do modo como se relacionavam.
James D.G. Dunn observa que a mesa do Senhor "não podia ser um negócio particular em que cada qual fizesse o que quisesse.
A Ceia do Senhor não era a Ceia do Senhor, se não unia a comunidade participante em mútua responsabilidade de uns com os outros."
A recomendação paulina "uns pelos outros" exige não apenas a comunhão que os cristãos devem exercer entre si, mas de torná-la manifesta pela mutualidade.
Os cismas dentro da igreja de Corinto prejudicavam a celebração da Ceia.
Em meio às disputas os seus relacionamentos deixavam de estar em desconformidade com aquilo que eles eram em Cristo.
Conseqüentemente, a igreja de Corinto realizava uma ceia que era propriamente sua, mas não do Senhor.
Não é de se estranhar que após uma esclarecedora observação acerca dos juízos que estavam disciplinando a igreja, o apóstolo termine com esta conclusão "assim, pois, irmãos meus, quando vos reunis para comer, esperai uns pelos outros" (vs. 33, grifos meus).
A participação da reunião não estava de acordo com o seu valor, assim, poderia ser considerada indigna.

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